Análise: As pequenas margaridas
Sedmikrásky é um filme de comédia dramática tchecoslovaco de 1966 dirigido e escrito por Věra Chytilová, Ester Krumbachová e Pavel Juráček. Protagonizado por Jitka Cerhová e Ivana Karbanová, a obra cinematográfica é um marco do “cinema novo tcheco”.
A primeira vista, o filme pode aparentar um certo psicodelismo extravagante e talvez meio parado para o público mais jovem, porém, tem uma forte mensagem de uma sociedade ainda não cicatrizada pela segunda guerra e no meio do campo da guerra fria, pois, como a obra se passa na atual República Tcheca, que na época estava sob a tutela da antiga União Soviética, nos mostra claramente essa tensão que pairava sobre o país.
As cenas durante os créditos de abertura se revezam em uma engrenagem e um bombardeio de alguma cidade que entenderemos seu significado apenas no final da película, mas isso já dá um gosto da montagem cinematográfica que esta por vir (com muitas mensagens que no começo parecem sem sentido, mas com o passar da trama vão se explicando e se encaixando fazendo parte de um cenário maior).
O filme tem uma fotografia e paleta de cores impecáveis, ‘Věra’ faz com maestria cortes de cena dinâmicos e cenários em preto e branco que começam a transbordar um arco-iris de cores, ou ficam apenas em tons monocromáticos de azul, verde, etc. (Dizem as lendas que vários videoclipes na época se inspiraram nesse método de filmagem e edição). Os diálogos e sentimentos das protagonistas, que por si só já fazem um show a parte, seja por seus improvisos filosóficos, ou pela naturalidade de suas expressões, acabam deixando o filme mais leve e divertido de se assistir em meio ao caos em que elas querem implantar nas suas vidas e das pessoas ao redor.
As duas personagens se chamam Marie (Marie I e Marie II), porém adotam diferentes nomes e personalidades ao longo da história, às vezes para se encaixarem ou desconstruírem determinadas situações em que estão. Cansadas do mundo em que vivem, elas decidem serem “más” ou apenas o oposto em que a sociedade na época exigia, e assim começa a trama: duas garotas cansadas da repressão fazendo varias travessuras que a primeira vista eram inocentes. Doces e anárquicas, suas brincadeiras variam entre o infantil ao mórbido, muitas vezes quebrando a parede entre eles e não sabendo onde um começa e o outro termina. O filme é cheio de metáforas sobre a guerra, juventude, rebeldia e censura política, que para captar tantos detalhes, é recomendado você assistir à obra mais de uma vez.
Por questões politicas, das quais não quero me ater muito, o filme foi considerado obsceno por um bom tempo, sendo que a própria ‘Věra Chytilová’ foi obrigada a se afastar das câmeras por causa da censura que rondava seu país.
Se você gosta da contracultura subversiva e o grito rebelde dos Baby Boomers nos anos 60, ou até um estudo sociológico do Leste Europeu da época, esta é uma ótima dica de entretenimento.